Espaço Silo, Matosinhos 02 Abril a 1 de Maio, 2016
Estrutura / Figura
Cláudia Amandi tem vindo a construir um universo visual formado pela acumulação de elementos gráficos, criando imagens onde o espectador alterna entre a perceção do conjunto e da marca isolada. Nesse movimento entre o particular e geral sucedem-se várias escalas de observação, permitindo ver os trabalhos em diferentes fragmentos ou frações, e também, convidando a estabelecer diversas distâncias de observação. A relação entre repetição e variação constitui um efeito convidativo à deriva do olhar por uma superfície instável e irrepetível. Nas séries anteriores, a marca constituinte é normalmente abstrata e elementar. Em séries como “Revoada” o conjunto ou estrutura de marcas resulta numa forma figurativa, ou pelo menos sugestiva de um fenómeno reconhecível. Naturalmente, os desenhos afirmam sobretudo a tarefa processual implicada no ato de fazer, na temporalidade da execução, na relação entre disciplina e improvisação e na definição de regras e os seus desvios. As formas resultam de movimentos e ritmos, sublinhando a condição mecânica do processo de desenhar. Ao espetador é deixada a tarefa de reconstituir esse processo sob a alçada de um reconhecimento figurativo, que é, no entanto, antecipada no processo. Para além de uma leitura dos procedimentos de produção gráfica, existe também sugestão de uma forma ou de uma figura, devidamente sublinhada pelo título. Deste método, cada imagem ou conjunto de imagens resulta da criação de um sistema de repetição de movimentos, como em Centrípeto, onde os círculos concêntricos definem uma força ora expansiva, ora concêntrica, como, aliás, o título indica. A criação de um padrão corresponde a uma estrutura gráfica de gestos e movimentos. Em algumas das novas séries agora apresentadas, realizadas em 2015 e já em 2016 – “Choro”, “Erva Daninha” – o elemento figurativo surge mais cedo, na forma da própria marca que compõe o padrão do desenho. Em “Choro”, as elipses concêntricas remetem para s superfície da água sob a chuva, metaforicamente designada de lágrimas. Em “Erva Daninha”, os traços verticais são sugestivos da forma da erva modelando um terreno. Alguns trabalhos partem de um pressuposto inverso, nascendo na realidade dos objetos para se apresentar como um padrão abstrato e distanciado da perceção. “De Perfil” e “72 páginas de notas de 520 dias” resultam de fotografias ou digitalizações de cadernos pessoais, afirmando o poder da acumulação, do arquivo de camadas na memória, num processo de sobreposição que apaga, realça e desfoca. Mas também nos trabalhos mais figurativos existe uma narrativa processual. Por exemplo, em “Erva Daninha” existe um aproveitamento de marcadores gastos, aludindo a um processo de esgotamento e a uma imagem construída contra a ideia de apagamento. Nas diferentes versões, a criação de séries amplia o binómio da repetição e variação, reforçando o carácter expansivo comum a todos os trabalhos. A ideia de uma expansão ou invasão é o efeito visível da passagem do tempo, num paralelo com o desenvolvimento do registo gráfico. Aprofunda-se assim a disciplina do desenho como economia dos meios, na afirmação de universos visuais que são simultaneamente específicos na aplicação restrita de elementos, como também amplos nas suas possibilidades de interpretação. (I)